terça-feira, maio 18, 2010

Meninas do Rio


Para começar, não existem nomes. Não existem rostos. Algumas são de lembrança recente, outras não sei se existiram ou se são feitas de sonho.
Não me lembro de todas, é claro. Muitas viraram uma só, assim como uma se multiplicou, tomou o corpo emprestado de outras tantas memórias, suas feições, jeito de andar, cheiro de dias e noites.

Elas andam por aí, afinal, esse é o Rio. Praia, calor, sorrisos, cabelos longos e lisos, ondas verdejantes, areia nos pés, cheiro da maresia, perfumes doces e amadeirados, olhares cítricos, pernas de fora, fome de leão. Algumas vezes esbarro com elas no metrô ou nas calçadas do Centro da cidade, ainda outras vezes nos restaurantes do meio-dia ou no ônibus saindo do trabalho. Mas elas estão sempre aqui, ou por aí, ou por acolá. As Meninas do Rio merecem mais do que uma Garota de Ipanema, merecem mais do que um samba de uma nota só, merecem mais do que ser apenas Geni. E é delas que vou falar. Delas e dos encontro e desencontros que a cidade grande nos permite, ainda que encoberto pelo anonimato da multidão. Quem sabe uma delas é você? Ou, quem sabe, uma delas não é você, mas se torna você à medida que a leitura acontece, a medida que as partes vão se encaixando, com o passar das letras, dos pontos e vírgulas. No fundo, todas são cada uma. E cada uma está aqui, fantasiada com a beleza que traz no sangue, no suor e na lágrima.

Uma ode, uma paródia, uma prosopopéia, um épico, uma forma de dizer para as mulheres o quanto são belas. Cada uma do seu jeito, cada uma ao meu olhar.


1 - a menina dos cabelos quase invisíveis

Aconteceu ontem. Entrei no ônibus cheio, e tomei um susto. Uma menina rosa, vestida de executiva. Camisa de botões desajeitados, mangas arregaçadas de um dia de trabalho. Os olhos escondidos por baixo das lentes dos óculos de aros finos de metal pareciam procurar um ponto qualquer para, enfim, se entregar ao merecido descanso. O tempo passara pesado para ela nessa última semana. Sexta de lei, dia de se jogar sozinha nas cobertas desarrumadas que, hoje, faziam aniversário. Sua cabeça já pendia um pouco para o lado e esse pequeno desvio foi o suficiente para perceber como seu pequeno cabelo, cortado curto, rente a cabeça, era fino. Quase uma seda. Quase invisível.

Precisei me recuperar em questões de segundos, que pareceram fugir, para depois se esconderem em minhas memórias. Olhei em volta e vi uma cadeira vazia, lá no fundo do coletivo. Atrás de uma daquelas cadeiras mais altas, de onde nada mais podia ver. Liguei o aparelho que toca músicas e cabe na palma da mão. Procurei a trilha perfeita para a solidão. Solidão depois de ter quase não visto os pequenos fios da pequena. E que, de quase invisíveis, não consegui mais esquecer.

Um comentário:

Gil Pender - Livre como um táxi disse...

Fala a verdade, Jabota: vc tá comendo geral aê.

Papão! Piruzudo! Peludo!