sexta-feira, fevereiro 17, 2017

Terra à vista

Cerveja Social Clube - minhas colunas lá

"Minha terra tem palmeiras
Onde canta o sabiá.
As aves que aqui gorjeiam
Não gorjeiam como lá."

Gonçalves Dias


Escolhi começar este texto com uma pequena parte do poema Canção do Exílio, de Gonçalves Dias, por um simples motivo: saudades. Ah, palavrinha tão nossa, muitas vezes sem tradução para outras línguas, mas que sabemos, como nenhum outro povo, sentir.


Ok, sei que você espera ler sobre cerveja, não literatura romântica. Mas é impossível escrever sobre cervejas sem lembrar das minhas queridas cervejas do Brasil. Estou curtindo um exílio auto-imposto, aproveitando tudo o que a Europa pode oferecer em termos de cevada e lúpulo, e ainda assim não consigo parar de pensar no que deixei para trás, aí no Brasil.



Sinto falta da rapadura moleque, escondida em um gole da Indica. Do cacau, na Cacau IPA.
Do amargor sem fim da Green Cow. Do Petroleum, que é nosso! AHA UHU! Do café de verdade da Hop Arábica, do maracujá,da carambola, das frutas amazônicas. Do nosso jeito meio imaturo, ainda começando a caminhar, de fazer cerveja. Das nossas invencionices de panela, das nossas caras de surpresa quando encontram um rótulo novo. Sinto, principalmente, saudades de respirar essa cultura cervejeira, de saber onde encontrar pessoas que gostam tanto disso quanto eu. Não há sabor, tradição, cultura ou insumos frescos que façam valer a pena deixar para trás os sabores que aprendemos a amar.



Que a indústria cervejeira nacional seja mais valorizada, de cima para baixo. Que o governo apoie essa nova geradora de empregos, divisas e ressacas. Que o público entenda que muitas vezes é melhor tomar uma IPA recém saída da fábrica do que uma que atravessou o oceano, sofrendo em containers. E que eu possa, por muito tempo, ter cervejas de qualidade para beber e me orgulhar, como fiz hoje, aqui, neste texto.
Tim Tim

Três lúpulos


Cerveja Social Clube - minhas colunas lá

Tags:cerveja, duvel, hops, lúpulo, tripel
Categories: Mesa de bar

Para mim foi uma surpresa quando recebi o convite para escrever s obre cervejas. Sou, na melhor concepção da palavra, cervejeiro. Gosto de beber e, com o tempo, fui experimentando tantos sabores e estilos diferentes que já me considero um conhecedor das loiras geladas. Mas não vou muito longe. Não sou especialista em lúpulos ou maltes, sou uma pessoa comum, que gosta do que bebe e tenta beber sempre o melhor. Em tempos de sommelier de cervejas, degustadores profissionais e professores de cervejo-conhecimento, é bom poder ver que ainda existe espaço para um companheiro de copo escrever sobre sua bebida preferida.

Como falei ali em cima, tento sempre provar o que de melhor há nas lojas e gôndolas. E foi numa dessas experiências que provei a edição especial da Duvel Tripel Hop. Se o nome já traz certa familiaridade é porque Duvel é uma das nossas mais queridas belgas, muitas vezes porta de entrada para outros estilos de cerveja. Nessas edições, a Moortgat resolveu aumentar a lupulagem e dar uma cara diferente a um de seus principais produtos.

Como grande diferencial, a edição anual recebe três tipos diferentes de lúpulo: Saaz e Golding, como base e um terceiro, variável de acordo com o ano, adicionado também no dry-hopping. No fim das contas, são eles que escancaram a personalidade da cerveja.



Na edição de 2012, a Duvel recebeu o lúpulo Citra. Recordo de abrir a garrafa e já ser recebido com o aroma cítrico (como o próprio nome já diz) que se repetiu no momento em que o coloquei no copo. O primeiro gole me lembrou aquelas limonadas geladas, que matam a sede depois de uma pelada jogada descalça pelas ruas do bairro. Cerveja refrescante e leve, apesar dos 9,5% de graduação. Uma paulada, que desce macio como deve ser. Após essa experiência, resolvi tirar a prova dos 9 e mandei abrir uma edição de 2013,onde quem manda é o lúpulo japonês Sorachi Ace.

Duvel Tripel Hop 2013Todo o frescor da 2012 deu lugar a uma experiência mais oriental. Bem mais contida, no aroma e no sabor, a Duvel Tripel Hop 2013 é elegante e zen como a cultura oriental. Os aromas herbáceos e térreos, como as primeiras gotas de chuva na terra, apareceram, mais uma vez, com muito equilíbrio. Lembre-se, estamos falando de uma cerveja com 9,5%. É um gole complexo, muitas vezes indecifrável. É, podemos aproveitar a ligação com a terra do sol nascente e brincar, apelidando essa cerveja de ninja já que, como esses guerreiros, é difícil de ser identificada.
Depois dessas duas experiências, quem teve que ser ninja fui eu. Primeiro, para encontrar o caminho de casa e depois, pé após pé, para caminhar em silêncio e não atrapalhar o sono da minha gueixa. Até o próximo gole.


hoje, mais especificamente, quero reclamar.
da vida, em geral.

Acordar com sono, despertador tocando. levantar para o frio (e olha que nem frio faz), ainda baqueado. Ir fazer o café, antes tomar o remédio, opa está acabando - preciso marcar médico. Fazer o café, contar as fatias do pão de forma, ver se tenho pão o suficiente até semana que vem, lembrar que devo ao banco. Droga, já me cobraram mais 35 euros de multa.

Tomar o café, lavar a louça, vestir a roupa gelada, colocar casaco, casado, luva, capacete... escovar dente, esqueci. Sem tênis dentro de casa...
Entrar com a bicicleta apertada no elevador. cara a cara com o pneu fétido, a borracha imunda pedindo um beijo de língua, frio na cara, pedalo contra o vento. Nariz escorrendo, vento, frio. Luvas na mão, corrente solta/marcha arrebentada. Roda torta que não tenho dinheiro para consertar. Mulher cansada, os problemas de casa vêm junto na cabeça, as contas atrasadas, as multas, o frio, o vento, a promessa de um dia as coisas vão melhorar, a falta de respostas, preciso ir, preciso ficar, caralho, o carro.
bateram no meu carro parado em uma vaga na rua, caralho. a porta amassada, carralho. carro. caro.
mais uma merda pra chafurdar. trabalho, que saco, dor no ombro, dor no braço. dor na coluna, pernas fracas, sexta-feira, uma lata de milho, outra de atum e o almoço está na mesa.

Dia que não anda, vontade de ir embora, vontade de largar tudo, esquecer, desistir...

bosta.

vida que segue


coloco um música, tento dar uma animada...

redescubro o Sun Kill Moon.