terça-feira, agosto 01, 2006

Limpeza de HD, no trabalho.
Muito trabalho.

Projeto 365 – A explicação.

Antes de começar a escrever e perder alguns minutos dos meus dias, todos os dias, pelos próximos 365 dias, gostaria de explicar o projeto.
Tudo começou de uma idéia simples, do tipo, escreverei todos os dias do próximo ano. E, pela primeira vez, resolvi topar a empreitada. Vamos ver como ela termina. No mínimo terei escrito mais de 10 páginas e poderei até publicar essa loucura.

A primeira intenção era contar como pode ser um ano de trabalho dentro de uma agênia de propaganda. Levar para quem tiver vontade de saber, as piadas, as discussões, a forma de criar uma campanha, desde seu brainstorm até a peça final produzida. Mas os dias de uma agência de publicidade podem ser meio frustantes e envoltos em certo marasmo e tédio, bem diferente do glamour idealizado por toda uma classe estudantil prestes a entrar no mercado e por outra prestes a entrar em um curso superior de comunicação.

Com o tempo e com o amadurecimento de idéia (em uma semana, se isso tudo) surgiu o primeiro problema: fugir do formato blog da vida, apesar de, provavelmente, esses textos verem a luz do dia primeiro em alguma página da internet. Mas o estilo diario virtual não é o estilo principal do projeto. Poderá e será usado algumas vezes, perdoem meu superficialismo voyerístico. Mas não será a forma que será tomada.

E já que estou falando de problemas, mais um apareceu com o tempo: a temática.
Publicidade e criaçào é muito interessante, mas não é a vida de verdade. O mundo explode a nossa volta, pedindo para ser relatado, sofrendo da falta de significação de uma imagem sem legenda. Enfim, não é possível se desligar durante 365 dias do que acontece no planeta Terra.

Chega de explicação, que ela está confundindo mais do que esclarecendo. O Projeto 365 é um relato em forma de texto de um ano. Um que começa agora e que vem, como todos os outros, sem grandes mudanças no nosso dia-a-dia.


365

Cinco, quatro, três, dois, um...
Foi o que pareci ter ouvido em meio a tanta gritaria e felicidade presentes à praia de Copacabana. Começa 2005. Um ano novo, como todos os outros, que fica velho um ano depois.

Dois mil e cinco é um ano qualquer. Não tem Copa, não tem Olimpíada, não tem Pan no Rio. É um ano regular, sem grandes destaques. Por que escrever justo sobre ele então? Por que fazer dele a base para um projeto? Estas perguntas, deixo sem respostas.

Sem perceber, saímos da virada do milênio, do bug e de sua insegurança e cá estamos no meio da década. Cinco anos se passaram e mais cinco nos separam de 2010. O ano em que faremos contato. Até lá teremos descoberto a cura da Aids, a cura do câncer ou, pelo menos, a cura da ressaca.

- Olhem os fogos.
O espocar da pólvora forma figuras de difícil compreensão. Amanhã leremos no jornal se eram palmeiras ou rosas, corações ou fígados, rolhas ou champignons.

- Olhem o banho.
De nada adianta o aviso, o estrago está feito. O cheiro de sidra barata marca a entrada de 2005, um ano novo molhado e alcoólico. Nada mal para um ex-quase-alcoólatra.

- Olhem as sete ondas.
Pulem as ondas, pulem. Fujam, corram. Em 2005 ondas são sinônimos de destruição e de morte. Mais de 150 mil feliz ano novo a menos em 2005. Seis, e não sete, ondas calam os votos de um sem número de pessoas. Agora números numa estatística macabra mostrada em vários ângulos na TV.

- Olhem o ano. É 2005.
Feliz 2005. O ano que fica pra sempre marcado nestas linhas.


364

Ressaca. Seis horas a 100km/h. Um dia de sol e de frio. O ar do carro refresca a viagem de volta para casa. Era um sábado.

Sem trilha sonora, sem reviravoltas, sem muito o que dizer. É o ócio, o tédio, o tempo parado, mesmo em movimento.

Me dá um pão com salame e boa noite. É tudo o que deixa um dia que passa sem graça, sem nada. No final é tudo o que deixo aqui.


363

Primeiro dia útil do ano. Segunda-feira. Primeiras horas de trabalho. Primeira encruzilhada do 365. Aqui tudo parece tomar forma de diário, de experiências pessoais. Como falar do dia sentado na frente do teclado, da tela brilhante, das xícaras cheias de café (duas até agora) e do ar-condicionado, com sua gélida língua nórdica lambendo minha nuca, sem parecer chato e repetitivo e sem parecer que estou escrevendo para um blog ou, pior, para uma agenda de adolescente?

Frases longas nunca combinam com pontos de interrogação. O sentido da questão se perde no caminho. O que me leva para mais uma encruzilhada do projeto. Minha mente é um caminho caótico de pensamentos. Uma espécie de Avenida Paulista na Índia. Como conseguir colocar em ordem alguns deles e passar para o papel, sem perder totalmente o sentido é uma luta. Agora diária, até o fim do ano. Fico pensando na última página, na última linha, se estarei feliz por ter terminado ou se estarei estafado, estressado e desgastado por todo o tempo que passei escrevendo. Se sentirei saudade ou alívio ao digitar o ponto final.
É pensar demais.

***

O dia me reserva, além de mais xícaras de café e um almoço em um restaurante natural, um cartão de aniversário para uma cooperativa médica e um slogan para uma farmácia. Nada glamouroso, não é mesmo? Não sou um profissional qualquer. Tenho um certo tempo de mercado, já ganhei até alguns prêmios, não muitos, não importantes. Mas já fiz concorrências, campanhas felizes e títulos inteligentes. E, de repente, volto a fazer cartões de aniversário e slogans para farmácias. Não estou indignado, mas sinto que poderia ser melhor aproveitado. Pelo menos, estou com tempo. Escuto minhas músicas o dia todo (Super Furry Animals agora) e quando paro para trabalhar resolvo os PITs (pedido interno de trabalho) com certa facilidade. Tenho 28 e não tenho nada. Uma TV 29”, um som que lê DVD e uma cacetada de discos e livros. Não preciso de mais.
Por enquanto.

***

Duas xícaras de café e uma asia gigante a mais. Slogan defendido e aprovado. Quanto ao cartão, adiado para amanhã. Não disse?
Três dias e já acho que falar da rotina de uma agência de publicidade não vai me levar a lugar algum.


362
O dia começa numa morosidade que me lembra, pelo menos, de uns mil dias iguais a este. Dias onde nada especial acontece, onde tudo passa por passar e você vê cada minuto de sua vida indo embora, sem poder fazer nada, sem poder sequer pedir para aproveitar um pouco mais. É um dia que, se eu não me forçar a escrever, não tenho nada para colocar aqui.

Parem para pensar. Ou não parem, continuem lendo e reflitam. Quantos dias desses você teve em sua vida? Dias que não parecem ter a menor finalidade? Dias cinzas, como vou chamá-los de agora em diante.

No dia cinza, tudo parece um pouco sem graça. A comida fica sem sal, o almoço vira obrigação, o acordar, o tomar banho, o se vestir, o fazer o café, tudo é automático. O trabalho é automático. E preguiçoso.

As horas passam devagar, o dia se arrasta. Tudo o que você quer é poder estar no meio da chuva que molha carros e árvores. Deitar em sua cama, ligar o aparelho de som, comer uma barra inteira de chocolate e assistir à Sessão da Tarde, sem ter que se preocupar com quem vai pagar a conta de luz.

Coincidência ou não, o dia que amanheceu ensolarado e quente, ficou nublado. Cinza.

***

O cartão já foi feito. Uma solução cachorra, mas apropriada. Dois anúncios aparecem para hoje. Um é uma chamada para uma assembléia ordinária. O outro, vende novos equipamentos de uma clínica de diagnóstico. Interessante este último. Mas o lugar onde passarei o carnaval é agora minha maior preocupação.

361
Vejam que interessante. Criei um espaço pensando em escrever sobre o trabalho, todos os dias. mas foi justamente o trabalho que me fez não ter tempo para escrever sobre ele.

***
Paradigma digno de aulas de introdução à filosofia de primeiro período de universidades públicas, em um daqueles cursos que trocou de cara no meio dos anos 90, perdendo toda sua aura transgressora e trocando os bichos-grilo por filhinhos e filhinhas de papai e mamãe.
***

Em compensação, o resto da semana, continuando nesse ritmo frenético tende a passar como o vento. São anúncios, folhetos, campanhas que viram não campanhas, que viram anúncios que saem logo mas levam tempo para ser finalmente aprovados. Um folder em formato de barraca de praia. Arme a sua.
Coisas assim. Uma semana corrida, alguns trabalhos e a falta de um computador em sua casa, na minha casa, podem levar à bancarrota um projeto legal como esse. E o mais incrível, em menos de uma semana.

Me recuso a aceitar a derrota como resposta aos meus pedidos de tempo. não deixarei isto morrer como deixamos um moribundo a sua própria sorte. Mereço e vou levar adiante todas as minhas resoluções de ano novo. mesmo que elas se resumem a este espaço virtual e a vontade e desejo de ver estas páginas publicadas no final do ano, com seus agradecimentos e afins. pelo menos não precisarei me preocupar com o presente de natal de muita gente. Eu disse natal? Esqueçam. Faz duas semanas que o natal não passa de umas contas a mais na minha fatura do cartão. E em alguns livros novos ainda por ler.


360
Um dia cinza, entendem?

O trabalho se torna algo tão mecânico que nem merece mais ser tratado aqui. Seja aqui uma folha de papel, um documento aberto em frente ao teclado ou uma página de internet.

Mais uma tarde com cafés, pães, refigerantes, músicas e nada a mais. Experiências de vida se tornam aparentemente coisas fúteis. Andar pela praia, molhar os pés na beira de um rio, pescar, plantar, subir em árvores são memórias distantes da infância. Mas meu vídeo-game tem um jogo parecido com uma pescaria, outro que me coloca dentro de uma mata, como fazia quando era menor.

Se estiver sem tempo para socializar, coloque sua conexão de internet para funcionar, e entre na pele de seu avatar. Caminhe por mundos irreais, fazendo amigos imaginários que aparecem em sua tela, e lembre-se de cada um dos amigos que você deixou partir apertando o comando para abraçar seu parceiro virtual. Ou fazendo outras coisas que não vem ao caso.

Viva uma vida de mentira, seja o que você sempre quis. Lindo, forte, mulher, cachorro, vouyer. Liberte-se de suas amarras sociais, numa sociedade sem regras, sem cobranças e com toda a liberdade que você sempre sonhou. Mas cuidado. Quando precisar, ninguém vai conseguir ouvir o seu pedido de ajuda.


359

A primeira sexta do ano não traz nenhum sentimento especial. Nem algo imperdível para fazer. Morar em uma cidade média tem dessas coisas. Tudo aqui é médio. A beleza da cidade é média. A das garotas, também passa com nota 5. Os trabalhos são médios, o salário, na média.
O custo de vida, advinhem? Nem muito alto, nem muito baixo. Médio.
Me consideram da classe média.

Que depressão. Pagar dois reais numa dose de cachaça e quatro num prato de torresmo é caro. Mas no café da manhã a gente pede uma média com pão na chapa, e ficam elas por elas. Pão na chapa é bom. Melhor se for o famoso mortadela com ovo. Depois de uma noite inteira de chapação, muito álcool e suor, um desjejum destes pode provocar o entupimento imediato de alguma artéria menos importante.

Onde foram parar os pedaços de mamão e o suco de laranja?

Um shopping médio e dois pequenos que, juntos, dão um médio. Uma ilha de mediunidade que recebe os espíritos do crescimento e do progresso vindos dos jorros negros do petróleo em nossas águas. Jorros estes que saem ou mais pro Norte ou mais pro Sul. Numa distância média da capital.

As rotas de fuga foram traçadas a centenas de anos, mas algo prende uma moçada aqui. Pessoas que ainda acreditam que boa vontade possa fazer a diferença. Mas todas elas estão na média, nenhuma acima dela.

Sem escolhas, ficam por aqui mesmo. Não que isso seja ruim. Ou bom.
Vocês sabem, fica na média.



358

Os sábados costumam ser dias engraçados. Neles, pensamos estar em sintonia com nós mesmos. É um tempo para descansar, para pensar na vida, fazer o que não podemos ou não queremos fazer durante a semana. Aqui, todos os excessos são permitidos, pois um domingo, geralmente inútil, nos separa da segunda e seus escritórios.

Menos por vontade do que por realidade, os sábados costumam passar sem serem registrados. São dias comuns, onde parar não vale. E assim, vão sendo esquecidos, um após o outro. As lembranças se embaçam, se confundem, o almoço que foi, não aparece mais. O strogonoff vira empadão de galinha, a sobremesa se era de chocolate passa a ter sabor de baunilha. As horas, as coisas, onde tudo são coisas, os meninos e as sonecas viram papel. Nem (n)eles se salvam.



357 – domingo
Fazer o que né?
Sabem quantas vezes ouvi essa frase neste fim de semana? Muitas. E sempre se referindo à vida, às escolhas feitas e ao tão esperado futuro presente nos sonhos do passado. Interessante e complexo, não?

Uma análise mais profunda da frase que abriu este texto pode mudar a vida de algumas pessoas. No mínimo, confirmar que vivemos em um mundo cheio de oportunidades. E que nenhuma delas foi feita para você.

Sim, é um tipo de pensamento vazio e desesperador. Mas, fazer o que, né?



356
Me perdi no tempo. Os dias não têm mais vinte e quatro horas, apenas dezesseis e, assim, me perdi no tempo. As oito horas a menos, sem contar com o horário de verão, cobraram seu preço. Dor em partes distintas de meu corpo e um atraso imperdoável em minhas memórias. Memória que já não é a mesma de alguns anos atrás. Onze deles, para ser sincero com vocês e mais exato para mim.

Aos dezessete, vivia em um mundo de fantasia, com um curso superior recém iniciado, tardes entregues ao João Pestana, também conhecido como Sandman e muitos, mas muitos churrascos e cervejadas. Nessa época comecei a beber mais. Com muito mais frequência. E a fumar. Pois é. Mas diferente de escritores de verdade que levam a boêmia, o fumo e a vida desregrada adiante, com certo sucesso, eu desisti.

Larguei o sucesso, que nunca esteve mesmo a meu lado e parti para a vida fora do sonho. Fumei, se muito, um maço de cigarro. Os compridos eram consumidos, geralmente, depois de muito beber. Passei mal um dia, culpa da bebida e vomitei o gosto de cigarro. Mas ele não saía de minha boca. O enjôo foi tamanho que desisti de fumar. A cena improvável, o sobretudo, a neblina, o cigarro aceso e o copo de conhaque ficaram para as tardes de sonecas depois do almoço. Sem problema. Casablanca nunca foi um dos meus filmes preferidos, mesmo.


355

Me apaixonei por uma letra. Uma letra “a”, uma letra “c”, um “o” tão bem feito, tão perfeito em sua circunferência, tão completo em seu jeito mais que simples de ser, que não foi possível me livrar de seu feitiço.

Um alfabeto inteiro, agora, me encanta. Em todas as suas milhares formas de associação. Tenho um alfabeto inteiro de amores, um dicionário inteiro de momentos e surpresas que esperam pela próxima página em branco, pelo próximo momento de pular da cabeça para o papel, passando por seu ombro, seu braço, suas veias, sua mão. Quando puder ler um obrigado, ou um até breve, firmemente escritos em sua caligrafia, me sentirei mais íntimo. Poderei ler seus sentimentos e traduzi-los para que possa entende-la. Escreva um abraço, nos vemos lá, escreva um beijo e me deixe a ler sua herança, a minha esperança, ao ser inundado por seus sentidos.

Deixe-me entender a cada instante, a cada linha feita à lápis, caneta ou pincel, o que se passa em seu mundo. Decifrá-la em sua própria língua, cheia de timidez e radiância. Deixe-me deitar o olhar em umas poucas manchas de tinta, imperfeições mais que perfeitas, dentro de um universo de ordem e compreensão.

E quando já não sentir mais o feitiço em sua escrita, poderei sempre ansiar por uma carta. Uma última, que me faça acreditar que para amar não são necessários encontros, atrações, desejos incontroláveis. Uma que me faça acreditar apenas na força das palavras. E no imenso amor que sinto por elas.

***

Sinto por isso.


354

Posso falar hoje de sonhos que nunca viram realidade. De sonhos que se tornam pó e são para sempre enterrados nas reminiscências de sua memória, sem que ao menos tenha sido dada a permissão de se sonhar.
Sonhei, uma vez, já acordado para o mundo. Com meu cérebro em seus máximos e intensos 3% de uso. E parei por aí. Sonhar dói e não melhora em nada a realidade, já tão vazia de esperança.

Seria mais confortável a não-vida, como uma alternativa à vida. Uma não-vida diferente da morte, como a conhecemos e esperamos. Como a não-vida de todos os outros espermatozóides que correram ao seu lado, mas não conseguiram te acompanhar. Teriam eles tido algum gosto da vida, alguma consciência? Algum lampejo de sua existência, enquanto célula, enquanto uma vida não realizada e, por assim dizer, já derrotada, antes mesmo de ter a chance de lutar?

Pense bem: se você, um derrotado desses, é o melhor de uma leva de milhões de espermatozóides, o que viria à luz se fosse outro o girino esporrento vencedor da corrida? Nesta fábula, a lebre nunca vai perder da tartaruga. Para ela, está separado um lugar junto de todos os eus que poderiam ter existido, e talvez existam em outras dimensões paralelas, se um milésimo de segundo mudasse as ações do mais remoto ancestral do ser humano.

***
O nascimento é algo tão involuntário, tão impessoal para quem está nascendo, que a única lembrança do momento do início da vida, se perde em caixas velhas e empoeiradas onde o papai costuma guardar seus álbuns de foto ou suas fitas VHS. Isso se o papai em questão tiver tido os culhões necessários para entrar na sala de parto, agora que passou a ser permitido a entrada de todos aqueles pêlos suados de nervosismo, infestados de germes e bactérias.



353 – quinta-feira

Escrever todo dia é tão cansativo e desgastante como ter que acordar todo dia, tomar banho, passar a camisa que combina com a cor da calça e do tênis, sair antes das oito para um ponto de ônibus debaixo de um sol tropical. O prazer dá lugar ao desespero de não se tornar repetitivo, de não ser muito pessimista demais nem muito otimista, de acertar a concordância e a ortografia, ainda tentando colocar em um papel algo digno de ser lido, digno do tempo gasto diante destas palavras.

Preencher uma página torna-se mais e mais desafiador. Como um jogador de futebol, que lá pelas tantas do campeonato tem um estiramento muscular por ter se esfrçado tanto e por tanto tempo. Pena que não existe estiramento no cérebro.

A última página está a milhas (e muitos dias) de distância e, se algo não mudar ao longo do caminho, meu ponto final virá carregado de sangue, suor e de um alívio gigantesco. A brincadeira de início de ano tomou uma forma tão desproporcional que parece um monstro que já começou a me consumir aos poucos. Foram apenas 12 dias. E parece que não vou aguentar.

Espaço. Ponto. Pausa para reflexão...















A página de hoje está virada.



352
Sexta-feira


Descobri em 10 dias, um pouco mais,um pouco menos que tenho um grande problema. Quando começo a escrever me transfiro para uma outra realidade, que se passa somente em minha cabeça e é transmitida entre o teclado e a tela do computador. Sair dela é muito fácil, basta alguém me chamar.

Uso um fone no ouvido, sempre ouvindo música, esperando me desligar do mundo que gira e funciona, e muito, ao meu redor. Estou, na maioria das vezes em uma agência de propaganda. Arrumar tempo para parar de pensar em clientes e anúncios, me desligar e começar a escrever nestas páginas não é fácil. Mas faço uma forcinha e tento, juro que tento, escrever todo dia. Os assuntos vêm e vão, entram por um lado da cabeça, fogem por outro e um dia ou dois depois voltam cheios de vontade, doidos para serem passados para a realidade.

Mas, após uma outra interrupção típica do trabalho, tento voltar ao assunto primordial, a discussão primária que é a dificuldade de voltar a discorrer sobre um raciocínio depois que você perde o fio da meada. Aconteceu, até hoje, em dois momentos. Estava absorto, digitando, pensando freneticamente, guardando teorias, criando associações de raciocínio que deixariam Freud de cabelos em pé quando fui interrompido. E de nada adiantou achar que depois voltaria a escrever naquelas páginas. Não voltei.

Os textos parecem incompletos, mas sinto que assim eles se fazem completos. Completos para mim. Completos para sua função de fazer lugar em uma projeto que pretende ser muito maior. As frases que os fecham foram pensadas para serem um encerramento mesmo. Mas o recheio ficou como o daqueles biscoitos de chocolate: muito pouco para encher uma boca.




351 – sabado

Fazer pontes. É a arte de um grande engenheiro, de um grande mestre de obras e de um grande escritor. Não sou grande, apenas alto. Mas as pontes entre os dias, deixam a coisa fluir e trazem uma estranha sensação de continuidade. Afinal são textos perdidos, únicos e referenciais. Não é literatura, não é cordel.

Egocentrismo à parte, é uma forma de dizer algo, de expressar algumas das angústias mais internas. É a minha terapia. Escrevo dias e dias, esqueço da vida por dias a fio, apenas para ver a página em branco pedindo por mais e mais. Querendo se ver completa por rabiscos, riscos, teclas, repetições.

Mas me sinto pequeno, na imensidão de páginas. Me sinto acuado no gigantismo de páginas em branco pedindo, praticamente me obrigando a escrever. Me sinto inexpressivo nas milhões de frases, sem sentido. Sou um caos de pensamentos mutantes não-lineares que lutam para não fazer sentido e que querem, por que querem, não valer a pena serem lidos.




350 – domingo

Leio sobre pequenas escritoras francesas de dezoito anos de idade, fazendo sucesso escrevendo sobre festas regadas a sexo, drogas e niilismo. Fim dos tempos ou mais uma nova moda para a garotada. Beijar, se entregar, gozar passa a ser o fim da estrada, onde tudo vale para atingir o ecstasy.

Infelizmente, não tenho uma vida tão agitada nem tenho mais meus dezoito anos.





349 – segunda











































348 – terça

Há dias em que acordo e me pergunto Por quê?
Porque aqui, porque agora, porque as escolha não puderam ser feitas desta ou daquela forma.















347 – quarta

Hoje é um daqueles dias. Acordei com a macaca. Não, não moro com um primata primitivo. Pelo menos acho que não. Nunca vi minha mulher catando piolhos, comendo formigas ou se pendurando em árvores. Muito menos deixando os pêlos grandes e negros, típicos do primatas não albinos, tomarem todo o seu corpo. Muito pelo contrário, ela se preocupa em estar sempre em dia com o Prestobarba.

O celular, que é cada vez menos telefone, toca pela manhã. Me faz sair de um sono nada restaurador e muito perturbador e passar para uma consciência muito perturbadora e nada resturadora. Banho, café com leite, panetone que sobrou em uma ponta de estoque em um supermercado qualquer de minha cidade e estou pronto para encarar a minha cadeira, o ar-condicionado e as ruas desta cidade.

Quanto a cadeira, não tenho problema. Ela é bem confortável.
quanto ao ar-condicionado, não tenho mais problemas. Lembrei-me de pegar meu casaco com capuz, presente de Natal direto de Gramado. Um santo remédio para a língua nórdica que vocês já conhecem.
Agora, as ruas de minha cidade... Essas merecem um livro em especial. Explicar como é se sentir um pedaço de carne em um liquidificador é complicado, mas é exatamente este o sentimento. Pior que isso, talvez. Pense como deve ser andar pelas ruas mais esburacadas do país.

A cada sacolejada do carro, a cada solavanco involuntário de meu corpo, a cada xingamento proferido e a cada murro desferido mentalmente em carros parados e em movimento, ao meu lado, perco um pouco da esportiva, perco um pouco do bom humor.
Enfim, o caminho de casa para o trabalho hoje foi infernal. Deixei minhas risadas, minhas piadas e meus bons momentos de uma manhã espalhados em pequenos buracos no asfalto vagabundo da minha cidade.

Pelo menos ganhei uma página escrita. Uma troca interessante, mas amanhã prefiro não escrever a ter que me destruir novamente em buracos e quelóides asfálticas.

346 – Quinta-feira

345 – Sexta

344 – Sabado
343 – Domingo
342- 2
341-3
340 4
339- 5
338- 6
337 – sab



336- dom
Faz dez dias que não escrevo. Algumas mudanças na minha vida me deixaram de mãos atadas quando o assunto é escrever e colocar no ar meus pensamentos. Idéias não faltam. Mas um gravador faria as vezes, com mais perfeição até, de um computador.

Acordo no meio da noite com textos prontos. Antes de me deitar, entre um comercial e outro na madrugada, me vejo inundado por raciocínios pertinentes e loucos para serem destrinchados, como um frango de domingo, num pedaço de papel. Todos eles, todos esses pensamentos são para sempre perdidos. Ficam em algum lugar, entre o nada e a verdade, de onde voltam para dar as caras, mesmo qeu seja a tapa ou nunca mais aparecer.

Existe algum lugar onde os pensamentos vão para descansar?


335 –

Faz tempo não sinto tanta dor em um dia de manhã como hoje. Fui amarrar o sapato e dei um jeito no ombro. Que coisa mais banal. Fiquei travado. Tomei café e destrui meu estômago. Umas pontadas fortes de dor atravessam meu corpo, me fazendo suar gelado e me encolher em cima da cadeira do trabalho. Pelo menos terminei de fazer um texto que já se arrastava por longos três dias.

O final de semana não foi muito diferente do resto. Fiz. pela primeira vez, um estrogonofe. Ou strogonoff. Fiz o arroz também e ele não agarrou no fundo da panela, nem queimou e nem ficou empapado.
Estou virando um verdadeiro chef do trivial.
As dores, a cadeira e o almoço bem feito no domingo, me fizeram transitar em volta de uma idéia que me persegue faz algum tempo. Voltar a estudar.
Adoraria estudar gastronomia, direito e cinema. Andei pensando em fazer medicina, estudar uma maneira de se manter um cérebro ativo mesmo depois da morte do corpo. Deixa eu explicar isso melhor. o cérebro, como o conhecemos seria retirado do corpo, mantido em uma solução, com a oxigenação necessária para que ele continue vivo e consciente. Sua ligação com o mundo real se faria através de um computador, de chips implantados no cérebro.

Visão, audição, paladar, olfato, tato, tudo seria perdido. Tudo em troca da vida eterna, para alguns sortudos. Ou azarados. Não gostaria de viver em um escuro total, as voltas com vozes em minha mente. Iria pirar. Prefiro a vida finita, mas cheia de sensações que tenho hoje. A consciência seria mantida, mas o cérebro não seria mais do que uma arma de raciocínio, sem movimento.

A idéia é estranha, concordo. No entanto, tenho a impressão que daria um ótimo roteiro. E que roteiro.


334 –
Imaginei uma viagem. Uma jogada de idéias e ideais para o alto, para bem longe da minha realidade. Uma nova vida, um começo sem problemas, sem emprego, sem saber cada esquina de cor, sem conhecer cada bar, cada garçon, cada virada de tempo, sol para chuva para frio para sol.

Imaginei a viagem, a maior viagem. O dinheiro da conta sumindo, os dólares entrando com força na vida, o avião, a luta por trabalho por mais dinheiro estrangeiro, todos eles valendo mais do que o que levo no bolso, o que tenho na mão. Pensei com força, mesmo que sem força de vontade.

E fiquei, em pensamentos, livre por um segundo de tudo o que me prende em qualquer lugar que esteja. As perspectivas, a felicidade, uma vida de verdade, funcional apesar de tudo. Livre até pensar em realidade. Na vida que me espera em qualquer outro lugar que não o que esteja naquele, ou neste, exato momento. Cheia de problemas e provações, cheia de novidades que perdem a fascinação com três dias de rotina, cheia de vontades inalcançaveis.

Era hora de sentar e chorar. Gritar pela mãe, tentar encontrar alguma força, a menos força, para me manter em pé, lutando ainda, pelo que possa parecer valer a pena. Mas a fila andou. Eu era o próximo.

Peguei o dinheiro, real e Real, dei boa noite à caixa do estacionamento do Shopping e paguei pela minha saída. Em troca de uma fuga, outra.
Preciso evitar ir ao cinema em dias de semana.


333 –
Não tenho
Tem coisas que acho legais, outras não.
Para quem não conhece, o cosplay (junção de costume e play) é o ato de se vestir como personagens de desenhos animados, vídeo-games ou mangás. É coisa de nerd, de maluco, enfim, não é coisa de gente normal.
Mas até aí, não vejo problema nenhum porque também gosto de RPG, quadrinhos, cinema B...

Ah, os orientais são, claro, o povo que mais foge da realidade tentando encarnar seus personagens preferidos. Tudo isso pra mostrar uma foto de uma chinesa/japonesa/coreana num encontro de quadrinhos em Hong Kong. Ela e seu cabelo azul claro.

Gostei do cabelo. É isso.