domingo, julho 04, 2010

Hoje dia 4 de julho, acho que finalmente entendi o que sente aquele cara que cansou de esperar pela nova salvação da musica e se contenta com os seus idolos do passado.
É como voltar para um abraço em que você sabe como encaixar, como uma boca antiga, onde não há mais segredos, como um noite dormida ao lado de sua esposa de décadas, onde cada um entende até o ir e vir da respiração.

Escrevo isso porque, faz uns dias, resolvi ouvir aos discos que tenho na mente desde os anos 90. Sim, pode ser uma lembrança afetiva, de uma época que não volta mais, e todos sabemos como nossa memória é seletiva a ponto de só nos deixar as memórias alegres. Um tempo em que se podia beber e beber no dia seguinte, sem a ressaca que parece nos transformar numa ameixa seca durante todo um dia, com dor de cabeça, o gosto de cabo de guarda chuva e tudo mais. Tempo de olhar, assobiar, amar, despertar e partir para a estrada. Tempo de deitar na cama, no chão, no sofá, ou onde quer que fosse, mas perto do toca discos e se deixar levar horas a fio por melodias. Encontrar a lágrima perdida, dentro de uma canção, a menina que ninguém mais sabe onde foi parar, o amor de adolescência que virou mãe de família e que agora enverga dois rebentos com o maior orgulho, apesar das marcas da cesária.

Música é sempre mais música quando se tem os hormônios em desequilíbrio. Elas acertam como niguém no cerne da questão. Talvez venha daí a famosa síndrome de Peter Pan que ataca roqueiros, sem exceção.

Não sei se foi a época intensa em que estou metido, de trampo, de falta de tempo, de falta de tesão com a vida, momento de pensar que a morte tá logo ali, e senti-la na mão, no coração, no olhar perdido de quem se foi. Acontece que os discos daquela época parecem estar cada vez mais amigos, mais próximos, mais fodas.
Não são pretensiosos como os novos amores. São companheiros. Amigos.

E mesmo discos que não chegavam de forma alguma às lojas de outrora, hoje simples pensamento de locais onde se encontravam amantes de música, podem ser achados com dois teclares corretos. Ainda esses, desconhecidos, se mostram como os amigos de infância que se passa anos sem ver. Num encontro novo, porém com gosto de tempo dividido, de segredos repartidos.

É, essa é uma puta viagem solitária. E muitas vezes é foda pensar nisso. Mas o vigor de uma época pode te facilitar as coisas. E nessas horas, os discos antigos com cheiro de ruas, pessoas ou terra molhada são a melhor companhia.

Siga em frente, mas não deixe as memórias para trás.

***

trilha sonora para esse texto:




Impossível escolher uma ou outra música. Todas são amigas antigas.

Um comentário:

Gil Pender - Livre como um táxi disse...

Estou reconhecendo nesse texto o Caio de dez anos atrás.