terça-feira, outubro 04, 2011

Faz dez anos.

Eu estava lá. No auge, com força nas pernas e muita vontade de gritar uhul para qualquer coisa que aparecesse na minha frente. Algumas delas realmente mereceram o cumprimento gutural. Outras, não. Mas há 10 anos atrás eu acabava passando por cima de convenções. Era um mundo mais estranho, menos preocupado com a natureza, com sacolas plásticas. Era um mundo diferente. E nele, o Sr. Medina quis fazer um mundo melhor. Ainda tenho os relatos escritos naquele tempo em algum arquivo perdido na web. E um e-mail do Caio, em sua sabedoria superior, me respondendo que aquilo ali ele já tinha visto e que, se não fosse um show do Hendrix, ele não encararia.

Hoje tenho a idade que ele tinha no RiR de 2001. E, como ele, tinha decidido não ir, não participar dessa louvação da bosta alheia. Mas acabei indo. Uma dívida histórica com o Metallica e a oportunidade de assistir (hum... verbinho difícil de ser conjugado em mega festivais) ao System Of a Down, depois de seu hiato de 4 anos. Como a volta do Bruce Dickinson ao Iron Maiden em 2001. Oportunidades históricas, que não foram feitas para serem perdidas. Sei que, no fim, acabam virando uma massaroca de memórias confusas em nossa cabeça, isso quando não se perdem em meio ao Alzheimer. Mas pelo momento, ah essa coisinha pequena e inestimável, vale.

Então deixa de lero-lero e vamos ao que interessa. Os relatos do RiR de 2011, menos rock do que nunca, mais evento social e VIP do que qualquer outro. Abro aqui um espaço para copiar as palavras do nosso querido capo, o Sr. Medina:
Um Rock in Rio para 15 mil pessoas a menos por dia, com o respaldo dos mesmos patrocinadores e um palco a mais, voltado a shows de street dance, foi anunciado ontem para 2013 por Roberto Medina, organizador do festival. Dez mil pessoas já compraram cartões que darão direito a ingressos, mesmo sem qualquer ideia de quem vai tocar - o que denota que o público concorda com Medina: "A música não é o mais importante, a banda X ou Y". "Ela faz parte do conjunto", esclareceu.”

Ou seja, as bandas poderiam ser trocadas por robôs (e não estou falando do Kraftwerk) e os instrumentos por mp3 players.

Eu, das antigas, ainda gosto de ver as bandas tocando. E por isso, resolvi acordar cedo no domingo, dia 25/09, para assistir ao show do Matanza, abrindo o palco Sunset, junto com o B Negão. Mas, como nada que a gente combina dá certo, não acordei tão cedo. Culpa do Márcio, da Aline e do Rodrigo, três grandes amigos que vieram prestigiar a nova cova da onça, em plena Tijuca.

Como eles chegaram por volta de 1 da tarde de sábado, e eu estava ansioso para mostrar a cidade inteira pra eles, acabamos rodando e rodando e rodando. Almoçamos uns quilos de carne em um restaurante no Humaitá, depois passeamos pela Cobal, voltinha na Lagoa, chuva e paramos no Enchendo Lingüiça, um bar no Grajaú, especializado em... lingüiça. Com fabricação própria, as maravilhas vêm recheadas de coração de galinha, pernil, calabresa apimentada, e até, acreditem, FEIJOADA. Cervejas e cervejas depois, voltamos para casa, onde continuamos a beber e ver DVDs.

Fui dormir às 4 da manhã, nada mal para quem encararia um dia inteiro de RiR. Mas Deus foi piedoso e o dia estava nublado, sem o solão de 40 graus da outra edição. Saímos de casa uma e pouco da tarde, entramos na “cidade do rock” as 4. O local, mais parece uma pracinha de cidade cenográfica, com suas graminhas verdes, de plástico que não morrem. Nada mal para quem viu o que aconteceu nos últimos espetáculos perdidos neste canto da cidade, meio barra, meio Jacarepaguá, meio nada.

Chegamos tarde para o Matanza, mas a tempo de ver um desfile de idosos, no Punk Metal All Stars, de dar dó. Clássicos e hits de grandes bandas, tocadas por pelo menos um integrante menos famoso de cada uma delas.

Era cedo, o Metallica começaria a tocar depois de meia-noite. Preferimos não encarar a turba e ficamos dando um mole ali na Rock Street. Um amontoado de casinhas estilo Projac, só com a frente falsa e um buraco onde colocaram todo e qualquer tipo de loja. Tinha Correios, Tam Viagens, Taco, Coca-Cola Clothing, Paco Rabbane... E, claro, milhares de pessoas em milhares de filas para comer, beber, comprar qualquer coisa. A revolução não será mais televisionada, ela será televisionada em pay-per-view e vendida depois em DvDs piratas na Uruguaiana. Tudo no RiR cheirava a marcas. Acho até que entendo o que o Medina quis dizer sobre a música. O que importa são os milhões aportando em sua, já bacana, conta corrente. Um espetinho MIMI, com um pires de batata frita por apenas 15 reais... Ah, claro, e entrar com comida ainda era proibido nessa primeira semana. A garrafa de Absolut Mandarin que um segurança não deixou passar na revista até entendo, mas meio pacote de biscoito?

Ah, claro, também tinham alguns shows. Que não vi. No máximo pude ouvir a narjara tureta gritando com o cara do Angra que depois disse não conseguir mais alcançar as notas mais agudas. Começa o primeiro show do Palco Mundo: Glória. Hora de ir para o outro palco, longe de qualquer caixa de som que amplifique esse martírio. Pena que no Sunset que tocava era o Sepultura. Com um som horrível, variando uma barbaridade, os seps seguraram um público imenso, que não conseguia se mexer. Foi ótimo e péssimo ao mesmo tempo. Fim de show, tempo para comer e beber mais.

Do Coheed and Cambria, só lembro do cabelo de samambaia. Acho que nessa hora fui no banheiro/pegar cerveja e buscar um lugar para ver o Motorhead que, se não alcançou grande destaque, também não decepcionou. Mas o show tava meio “pequeno” para um evento daqueles. É preciso mais presença de palco, Lemmy. Corre, pula, se joga na platéia, que hoje em dia, só música não segura. Pelo visto, quem aprendeu direitinho essa lição foi o Slipknot. Medo, uma pessoa me falou depois, tenho medo deles. E, sim, é para ter medo. O circo do inferno, com palhaço, monstro, nariz fálico e o escambau. Sempre achei o Slipknot uma banda com visual nota 10 e som, bom, nota 3. Em determinados momentos é só chato mesmo. Mas ali, para 100 mil pessoas, o espetáculo circense/teatral/musical funcionou às mil maravilhas. Colocar 100 mil pessoas agachadas, esperando a ordem para pular, não é para qualquer um. No palco, a emoção estava clara e transparente. Dava para ver os sorrisos por trás das máscaras. E, assim, o Slipknot detonou e colocou um monte de gente para correr atrás do som deles. O resto, vocês viram. Bateria de cabeça pra baixo, fogo, stage dive, só faltou o sangue, mas esse eles deixaram para a Ke$ha.

Com o trabalho de abertura bem feito pelos knots, o Metallica só teve que pegar a turma pelos cabelos e chacoalhá-los, enfileirando clássico atrás de clássico, com um pequeno coro de 100 mil vozes. Ou Whiplash é um clássico ou só é boa pra caralho, tanto que todo mundo conhece, gosta e canta junto.

E aqui fica a questão: Metallica ou Slipknot?

Slipknot atropelou, mas estavam todos ali para ver o Metallica. É como você ir a um grande restaurante conhecer seu prato clássico, comer uma entrada divina e confirmar que o prato é realmente clássico. Você foi afinal de contas, atrás do prato e não da entrada. Mas se curtiu os dois, melhor ainda.

Show por show, falando em aparato, bussiness, teatro, o do Slipknot foi melhor. Mas por isso, serem, afinal de contas, o Metallica, o prêmio de melhor show da noite fica com eles.

Espaço para abrir meu coração e falar que demorei demais para ver um show do Metallica. Cantei praticamente todas as músicas e percebi, no fim, que acompanho eles desde o início da carreira, passando por todas as fases, menos as de covers.
Ou seja, sou um fã.

Volta pra casa na madrugada, mortos de cansaço, com direito a caminho errado que dobrou (no mínimo) a caminhada que teríamos que fazer até o ônibus. Fora isso, volta tranqüila que terminou com um pão com mortadela e ovo, as sete da manha na padaria aqui do lado de casa.


***

Dia 02/10.

Não pensava em ir ao RiR. Ia ficar em casa, curtir um ou outro show ao vivo pela Globo mesmo (não tenho NeT em casa). Mas, uma manhã dessas, recebo o e-mail do Itaucard. Sou cliente deles e tenho preferência para comprar até dois ingressos por CPF. Opa, pensei. Acho que vou ver o Metallica.
Sem pensar duas vezes, comprei o ingresso e para não ficar mal na fita, comprei um pra Ju tb. Ela iria no dia do Coldplay, que já vi e não curti ano passado. Vejam bem, nessas horas, a adrenalina é total. Você não pode pestanejar ou perde o timing e os ingressos evaporam. Comprei na loucura, sem grana pra pagar, sem saber como iria até lá, essas coisas todas.

E, sorte das sortes, me lembrei de um cartão nunca desbloqueado que o banco tinha me enviado fazia uns seis meses, mais ou menos. Na hora liguei para lá desbloqueando o danado e ganhando, tãnam, a oportunidade de comprar mais um ingresso. Não pensei duas vezes, maldita adrenalina, e comprei um para o dia 02. Mais especificamente para o System of a Down.

Tudo jogava contra o dia. Era, afinal de contas, mais um show do Guns no RiR. O terceiro, seu Medina. Já tinha visto a papagaiada em 2001, depois do Oasis. Show, aliás, que não me segurou muito tempo, já que tinha que pegar um avião as 6 da matina para estar no trabalho as 8. Quase perdi o vôo, mas cheguei a tempo de ir virado e todo sujo de poeira, para a Criativa. Tirei as duas horas do almoço pra apagar e tentar recuperar alguns neurônios. Bom, voltando para 2011...

Saí tranqüilo de casa, às 18. Fui ouvindo o jogo do botafogo (uma merda de derrota ridícula pro Atlético de Goiânia), num ônibus que me levaria até a Alvorada, mas que deu uma voooolta que só pedindo arrego. Fico feliz de ter “errado” o ônibus sozinho e sem pressa. Mas ainda assim, cheguei na cidade do Rock a tempo de ver a pity(sic) matando uma canção do Nirvana. Deu até pena, com trocadilho. Mas na platéia, mocinhas, molecotas de preto e olhos pintados, mauriçolas parrudos e sem camisa e suas sempre juntas loiras de farmácia faziam o chifrinho e urravam, numa demonstração que deve ter feito a avó do Dio ter dado um esporro nele, lá no céu. Só por ter ensinado isso.

Saiu Pitty, vejamos o que vem a seguir... Evanescence. Não, amigos, não dá. Fui caminhar, catar um bob’s de 15 reais para comer, e beber umas cervas pra entrar no clima da noite. No caminho, percebi que tinham uns caras começando a tocar no sunset. Eram os titãs com os xutos e pontapés. Assisti ao show deles inteiro. Até durante o momento Toca Raul em que eles realmente tocaram. Sou das antigas, considero o Cabeça Dinossauro o meu primeiro disco de rock, presente do meu pai que não aceitou minha escolha por outra banda (acho que era a Blitz). Ele me disse: “ou leva esse ou não leva nada.” Levei. E desde então curto titãs. Uma curtição que foi perdendo força à medida que a banda ia perdendo seus integrantes. E desconsiderei a possibilidade de vê-los ao vivo, depois de tantos passos mal dados na carreira. Afinal, tive muitas chances, desperdiçadas, de vê-los no auge.
Melhor assim, que sem muita cobrança pude ouvir, pela primeira vez, AAUU, ao vivo. Foi emocionante.

Findado o show, caminho para conseguir um lugar mais perto do palco, mas ainda assim, looonge pacas. Perguntei para os jovens ao meu lado se eles eram fãs da banda ou se estavam ali para ver o Guns. Todos disseram que estavam lá só pelo System. Ótimo. Achei minha turma.

Silêncio. Bandeirona System of a Down no palco, veio a informação via facebook de alguém mais conectado que eu: são 29 músicas. Cacete, pensei...
E tomei a cacetada na cabeça, de peito aberto.

Som pesado, melódico, esquizofrênico, bonito, burro, bruto, gritado, urrado, sussurado...
Vocês também viram. Qualquer um pode ver, afinal, está tudo lá no youtube. Os engraçadinhos de casa tuitaram um monte de besteira. Mas nós, que lá estávamos, experimentamos um pouco do apocalipse. Esses caras não se vestem de palhaços, mas tem um circo dos infernos para apresentar para a gente. Em notas e letras. Apesar disso, um show com 29 músicas foi longo. Sempre pensei que isso era o mais próximo de perfeição que um concerto pode chegar, um mar de músicas enfileiradas, uma atrás da outras. Mas, admito, cansa. Lá pelas tantas, comecei a pensar que seria melhor ver um com 18 músicas, redondíssimo, cheio de hits, que maximizasse a energia de todos ali, que em determinada hora começou a se dispersar.
Diminui a nota da banda? Nunca. Mas coloca você para pensar se não é melhor ficar com o gostinho de quero mais, do que sair com a barriga cheia de comida, to estufado que tudo o que você consegue fazer é se jogar numa cama e apagar.

Estufado como estava com o show do SOAD, só tive uma alternativa: tomar o rumo de casa. Mas, em último dia de RiR, por experiência própria, nada é fácil. A galera alegre se transforma em animal. Todos querem ir para o mesmo lugar ao mesmo tempo e pelo mesmo caminho. Nada anda, empurra-empurra, fãs de guns, acostumados com o certeiro desdenho de seu ídolo, sentavam no chão aguardando a longa espera que, com certeza, viria. Preferi esperar sem me mover e uns 15 minutos depois, tudo estava mais calmo e vazio. A garoa já tinha aparecido e resolvi então me por a caminho. Na metade da caminhada de 1,5km até o terminal de ônibus, cai o toró. Água pra acabar de vez com qualquer força de vontade. Cheguei, uma hora e meia depois, em casa. Só encharcado, sem essa licença poética de alma lavada. Tomei um banho e liguei a TV. A água caia forte no RiR e o Axl perdia o fôlego a cada verso. Bem feito, fã de Guns merece sofrer.

Foi bom ver que ainda agüento perrengue, já que o SWU ta aí do lado, me acenando com MUITO perrengue. Fiquei feliz de ter visto os shows que queria ter visto, apesar de ser, vocês sabem, o festival mais vergonha alheia que existe. No final, até fiquei com vontade de tentar mais uma vez em 2013. Ainda mais agora que acabei de ver que o Medina disse que a prioridade dele é trazer The Boss, Bruce Springsteen.

E aí, alguém topa encarar uma outra viagem até a cidade do rock?

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