domingo, maio 10, 2009

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Marcelo.
Por que toda vez que vou escrever uma história e penso em um personagem, sempre vem este nome? Por que sempre Marcelo?!

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Marcelo ligou o computador. Estava à toa. Era sábado à noite e todos estavam na rua. Festas, brindes, goles e beijos em busca das pessoas.
Senha, OK.
Marcelo não tinha muita escolha, nem muita opção. Morava numa cidade do interior da Paraíba e a grana que tinha era a conta para pagar a faculdade particular. Com o computador ligado, no entanto, estava no mundo. Em todos os lugares, com todos os amigos e em todas as festas. Maravilhas que só a internet pode fazer por você. Uma checada nos e-mails, uma passada de olho nas notícias. Tédio. Parece que até a internet sai de casa num sábado à noite. As lembranças vem e vão. Os sites não passam de uma meia dúzia, nos quais Marcelo gasta a maior parte do seu tempo. Um Boa Noite escrito no twitter. As notícias do Treze. Ele se lembra do trabalho que tem que entregar até segunda. Mas não está com saco de fazer. Na verdade, está meio sem saco para qualquer coisa. Mas a internet, ainda que as moscas, é melhor do que qualquer programa que passe na televisão. O sono, parceiro faltoso.

Um, dois cliques. Rápido e em cima dos bonequinhos. A aba se abre e mais nomes e senhas são inseridos aqui. O verde não parece estar muito na moda no sábado à noite. Poucas são as pessoas conectadas. Pouquíssimas. Seu primo do Rio de Janeiro. Uma amiga que mora na Austrália e com quem dificilmente fala - afinal porque a adicionei aqui mesmo?
O tempo passa. Marcelo se lembra de jogos, das salas de fliperamas que freqüentava em João Pessoa. Das tardes quando sua avó vinha visitá-lo e fazia bolo com frutas secas. Marcelo adorava frutas secas. E comia o bolo com chá. Como será mesmo a receita desse bolo?
Pesquisa na internet. Bolo de Frutas. A receita ali. Mas e a avó? E o cheiro do bolo quentinho assando no forno e atiçando a molecada. Não abre este forno que o bolo sola, menino!!!
E as tardes?

Cadê meus amigos? Cadê todo mundo? Por que essa louca batalha por bocas diferentes, por batons e hálitos desconhecidos, por perfumes importados e maquiagem da Avon?
Marcelo se cansa de nadear na internet. Inventa de contar quantos meia-armadores chamados Chico o Treze teve em sua história. Pesquisa. Quer saber se algum outro amigo está online. São meia noite e cinqüenta. Domingo. Ufa. O sábado solitário se foi. Daqui a pouco tem corrida de fórmula 1. Será que alguém já está online? Não.

Marcelo tem tantos amigos adicionados e nenhum para conversar. Meio triste. E música? Vou ouvir uma agora. Tantas opções, mais de mil escolhas possíveis. Marcelo tem preguiça de escolher uma. Fecha o programa que mandaria, quem sabe, uma outra lembrança de algum lugar do passado. Já nem tão distante. O ontem é ano passado no mundo de velocidade 5. Olha só. Débora. Não, ela não está online. Sendo sincero, Marcelo sabe que desde que Débora arrumou o namorado novo, ela deve tê-lo bloqueado. Ou vai ver ela esquece mesmo de entrar nesse programinha de bate-papo. Ou entra escondida dele. Débora. De namorado novo. Namorado novo nada, né. Ele já era ex quando Marcelo a conheceu. Um intruso no meio de uma história de amor. Seria amor mesmo? E o que Marcelo sentiu? Era o que?

Ele quer acreditar que era amor. Ainda pensa nela. Tem saudades. Não do beijo, não da boca, não do sexo. Marcelo se sente só. E Débora preenchia um espaço como só ela sabia. Marcelo pensa em como a vida deles deve estar diferente agora. Ela já formada. Casada, será? Ele pensa em Débora grávida. Na sua felicidade, no sorriso. Ela está ali no programa ao seu lado. Desligada. Offline. Mas ainda assim, é ela. Marcelo, meio que automaticamente abre a janela do bate-papo. E fica olhando para a tela, como um pintor prestes a começar um quadro. Não existem palavras. Elas acabaram. Ficaram para trás quando deixou de ver Débora. O silêncio do interior, a noite fria, o computador ligado, a falta da avó, seu amor, sua histórias, tudo ali fazendo falta, tudo junto meio longe. Débora ali, ainda que não ali.

Marcelo ficou olhando para o nome dela por um minuto. Pareceu muito mais para ele, pareceu cada segundo dos cinco meses de namoro, de momentos juntos, de risadas e de pintinhas na pele branca de Débora. Aos poucos os dedos ganharam vida e, ainda que lentamente, chegaram ao teclado. Não existe mais assunto, nem coincidências, nem experiências vividas juntas. Marcelo, tecla após tecla, escreve. Uma palavra. Talvez tudo o que restou. Manda para a Débora offline seu beijo. E só.

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