quarta-feira, novembro 07, 2012

Aqui antes:

É um mistério. Alguns juram de pés juntos que é falso. Um truque. Outros que é uma aparição. Astrólogos diriam se tratar da conjunção de planetas e constelações em condições perfeitas de temperatura e pressão. Eu digo que é real.

Não só digo como posso provar que já vi. Presenciei com esses olhos que um dia a terra há de comer. Foram duas ou três vezes. Não mais que isso. A última aconteceu faz poucos meses, no centro da cidade. Ela passou quase ao meu lado e, de repente, tudo ao redor se tornou uma espécie de espera. Ela não caminhava. O que fazia era mais próximo de um levitar. Como se estivesse pisando em nuvens.

Ok, isso não é verdade. Era bem real e pisava, sim, no chão. Mas alguma coisa faz com que certas mulheres tenham um tipo de caminhar diferente. Como se o chão não existisse, ou fosse feito de ar. Passos leves e diretos, perfeita harmonia entre pés, pernas, músculos. Algumas, pouquíssimas, têm a qualidade excepcional de caminhar perfeitamente, olhos para cima, nariz arrebitado, como se estivesse em uma passarela de asfalto, pedras portuguesas, buracos e chicletes mascados. Como se a vida fosse ser levada sempre com a mesma pose. Diria, até, com certo ar monárquico.

Percebam que não falo de um tipo específico de corpo, de tamanho de pé ou de altura. O que mais importa é a imponência, um vagar que vem da alma.

Próximo a elas - essas fadas que caminham entre nós, pobres mortais de pés tortos, joelhos bichados e sapatos apertando joanetes - todos se sentem hipnotizados. É como se o tempo parasse. E lá vem ela. Pedestres abrem espaço, prendem a respiração, alguns homens menos fortes desfalecem pelas calçadas, atingidos por tamanho esplendor. É como estar frente a frente com um momento sublime. Da Vinci ao pintar Gioconda, Van Gogh ao cortar sua orelha, a primeira vez que as notas da nona sinfonia foram tocadas. É a sensação da presença de uma obra de Deus, à perfeição. Mesmo que só dure alguns passos.

Poucos são os felizardos que podem assistir a uma mulher que levita dessa forma. Uma maneira tão simples, um pé após o outro, que as mulheres têm de reforçar, de forma tão completa, seu domínio sobre os homens. Estaremos sempre aos seus pés.



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