domingo, fevereiro 12, 2012

Bunda


Senta a bunda e começa a escrever. Se quer viver de palavras é o que tem que fazer.

Não parece tão difícil de se pensar, mas é muito, mas muito mais complicado do que se pensa fugir do futebol na televisão, das páginas e páginas de bobeiras na internet ou da música que sai do fone. É um trabalho árduo, apesar de não cansar tanto os braços, escrever.

Então senta a bunda. Liga o computador. Esquece o futebol na televisão, diga não às malditas noticias da morte da última celebridade musical. Esquece a música... Bem, a música talvez não seja tão ruim. Ela relaxa, cria uma imensidão na mente. Com sorte pode trazer recordações, sensações, lembranças. Pode, mesmo, servir de musa. Inspiradora. Liga-se, então, a caixa sonora.

As melodias que saem como ondas levam as mãos a surfar pelo teclado.

Agora parece mais fácil dar adeus ao futebol na televisão, às muitas paginas de imbecilidades escritas na internet. Há que se admitir: a facilidade da negação é obtida pela falta de sinal do roteador wireless. Sem sinal, sem internet. Sem Facebook, sem Orkut, sem MSN, Gmail, notícias online, fotos de shows, vídeos da celebridade morta da vez.

Espera!

Pontinhos acessos, pirilampos em sua dança à procura de atenção. O sinal está de volta. Uma olhada nas mensagens recebidas na alta madrugada. Mesmo que você saiba, como sempre, que elas não serão mais do que anúncios de cupons de rodízio de pizza ou de diárias a preços nada módicos em pousadas afrodisíacas em Búzios. A onda musical também serve para um outro tipo de surf. Surfar as páginas, em intermináveis séries, cheias de vagas que te levam cada vez mais longe da costa segura do papel em branco, devir papel em telas de cristal líquido.

Segura a onda, camarada. Senta a bunda na cadeira, liga a máquina de escrever. Prepara a caneta para as anotações que virão. Começar a escrever, mantra, começar a escrever. A música, a internet, digita, vai, por favor, digita.

O locutor grita, berra, se esgoela. Por cima do gol. Tiro de meta, e lá vai a atenção chutada, junto com a bola, pelo goleiro. Correria, música, email, internet e a página, em branco.

Escrever é um ofício. Põe na cabeça. Não há Paris, não há festas. Lofts solitários em sobrados perdidos. Senta a bunda e...

Não. Esquece. Levanta a bunda. Isso, levanta a bunda, aproveita e leva o computador no colo. Aumenta o som. Vai pro sofá e se liga na TV. Depois escreve. Afinal, hoje é domingo.

E domingo é dia de futebol.

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