Lar é onde sua cabeça está
Uma das coisas que nunca me saiu da cabeça, nos mais de 20
anos em que morei em Vitória, foi: preciso voltar para o Rio. Foi lá que nasci
e de onde fui tirado, traumaticamente, por uma transferência profissional na
carreira dos meus pais. E tirando eles, que ainda moram na Ilha do Mel, não
tenho mais ninguém da minha árvore genealógica presente na cidade. Quem me
resta, em termos de família, está no Rio. E no interior de São Paulo. Ou em Santa
Catarina. Ou mesmo nos Estados Unidos, da última vez que soube, em Chicago e
Dallas.
Portanto, não deveria ser uma tarefa das mais difíceis dar
adeus e me colocar a “caminho de casa”. Acontece que a vida foi se espalhando
por Vitória, as amizades crescendo como raízes pelos quatro cantos da ilha (e
do continente) e, quando dei por mim, era impossível deixar tudo para trás de
uma vez por todas. A mudança veio aos poucos. Em determinados momentos, cheguei
a me dividir. Meio ano aqui, meio ano acolá. Até que, depois de muitas indas e
vindas, voltei para o Rio de Janeiro.
Mas por que o Rio?
Essa é uma boa pergunta. Além da família, claro, devo ter
outros motivos. Quando era mais jovem, eram as praias com ondas. Depois, os
shows nacionais e internacionais. Ontem, pelo Botafogo. Hoje, pela esposa. E a cada
dia me sinto mais (e menos) carioca. Perco tempo no trânsito, me aperto no
metrô, presencio o descaso de autoridades e cidadãos. Tomo café em um prédio da
época do império, me desbundo sempre que vejo a praia de Botafogo e faço o
sinal da cruz toda vez que passo em frente a General Severiano.
Entre desgraças e esperanças, entretanto, vou me deixando
cansar. Já não sinto o calor como um bem-vindo colega. Reclamo, quero frio. A
malandragem da canção é pueril na realidade, e faz com que você precise ser
mais esperto. Não há espaço para a coletividade. Não há gentileza gerando
gentileza, muito pelo contrário. Nós não somos os outros. O estádio está
fechado. Todos eles. Caindo no clichê (ou
seria na realidade?), sabemos que tudo será pior durante a Copa. Salários melhores,
aluguéis maiores. Almoço para dois por 250 reais. Todos sorrindo e seguindo em
frente. Então eu me pergunto: por que o Rio?
Talvez pela possibilidade de viver o Brasil onde ele é mais
selvagem, onde ele é mais Brasil. Para tirar o doutorado de havaianas no pé, o
canudo com cheiro de maresia, desviando de buracos nas lindas calçadas de pedras
portuguesas. Para ter que estar sempre atento e se deleitar com o que a
natureza nos presenteou de mais bonito. Para tentar ser melhor sempre, ainda
que a vida te prove o contrário. O Rio é isso. E enquanto não me resolvo, vou
vivendo como num reality show, estilo No Limite, onde o vencedor e o perdedor
se encontram no fim, sobre a mesma laje, mostrando o samba no pé.
Orai por nós.